quarta-feira, 20 de julho de 2011

A maldição da mancha

















A maldição da mancha

Papai era corretor de imóveis desde que se entendia por gente. Isso era já coisa de família, o pai dele era, e o avô também. Mas papai não me obrigaria a seguir carreira não, ele era bem flexível, e disse que eu é que deveria escolher o meu futuro. Mas se eu quisesse seguir os seus passos já era meio caminho andado, porque eu vivia enfiado na agência, e muitas vezes o vi em prática fechando contratos mirabolantes. Ele era mesmo muito bom negociante.
Eu me lembro bem de uma das vezes em que papai fechou uma venda grande, a comissão foi tão gorda, que papai não economizou. Comprou para mamãe uma máquina de lavar de última geração, um micro-ondas novo, e é claro, chegou com flores em casa e levou-a para um jantar a dois. Chegaram tão tarde que eu nem vi. Mas no outro dia, ela estava com um sorriso incontido no rosto e um anel cujo brilho prendeu a minha atenção, e não só a minha, mas a do meu gatinho também, que ficava correndo atrás do feixe de luz produzido pela jóia. Mas, o melhor mesmo foi quando notei que no meio da sala estava um pacote enorme embrulhado para presente, e um bilhete com meu nome nele. Fiquei semanas vendo estrelas. Já nem comia mais direito. Finalmente eu ia poder treinar para as disputas de fim de semana com meus amigos, pois tinha ganhado o tão sonhado vídeogame.
E como papai era um homem muito justo e moderado, imaginem só a surpresa que eu e minha mãe tivemos, quando um funcionário uniformizado tocou a nossa campainha em plena manhã de sábado perguntando pelo Sr. Gumercindo, meu pai. Atrás dele estava um Camaro igualzinho ao do Transformers. Amarelo com faixas esportivas pretas. Era realmente o Camaro Bumblebee! Na minha imaginação de criança, fiquei pensado em qual hora ele se transformaria em robô e falaria com a gente. O que é claro, nunca aconteceu.
– Papai, corre aqui em baixo. Tá acontecendo algo muito estranho!
– Deve ser a minha encomenda. Tô descendo já.
Minha mãe ficou em silêncio. Aturdida. Apenas esperando por uma explicação lógica para tudo aquilo, se é que teria alguma. (...)

E tudo se apascentou em nossos corações surpresos depois de uma semana. Como ele nunca havia feito nenhuma extravagância na vida que não fosse em prol dos outros, nada mais justo que agora ele realizasse o seu próprio sonho, por mais destoante com seu perfil que tivesse sido. Eu e mamãe acabamos adorando a idéia de desfilar por aí dentro de um carro meio super-herói. E nem preciso dizer o quanto o papai tinha zelo por aquele carro para vocês, não é? Limpava. Encerava. Lustrava. Revisava entusiasmadamente o bichinho amarelo. E se pensávamos que era empolgação de início, nos enganamos redondamente. Piorou muito. Com o tempo eu mal podia encostar-me à lataria, do agora intruso, sem o papai ralhar comigo.
Até que um dia o pior aconteceu!
Apareceu uma mancha amarela bem no meio da faixa preta daquele carro idiota. E papai foi à loucura. (loucura mesmo, vocês breve vão entender o que digo!)
De início ele pensou que fosse um descascado mostrando então a tinta amarela por baixo da bela faixa, mas não era. Era simplesmente uma mancha misteriosa. Nenhum dos profissionais conseguia explicar a origem daquela tragédia para papai.
Ele começou a ter um comportamento irritadiço a cada vez que abria o portão da garagem e lá estava a maldita mancha olhando para ele, debochando de sua impotência de se livrar dela. E parecia mesmo que ela se alimentava de sua tristeza, porque crescia sorrateiramente pelo capô, causando-lhe ainda mais dor.
 E assim, eu vi meu pai se transformar aos poucos numa pessoa totalmente diferente. Ele passou a ficar obcecado por manchas. Certa vez jogou a TV lá fora no quintal e dizia que a mancha agora estava querendo tomar também a sua casa, só porque eu tinha, sem querer, espirrado um jato de mostarda na tela da pobre coitada.
E como a mancha não parava de crescer, tudo foi piorando na vida de papai. Até que por fim, ele terminou despedido por se recusar a atender um cliente “graúdo”, só porque o sujeito estava com a gola da camisa toda manchada. Chegou até a agredir verbalmente o desavisado, que não entendeu patacas. Ainda bem que sendo muito querido por todos ao seu redor, o seu chefe nem lhe deu uma “justa causa”, e ele acabou recebendo ainda uma boa bolada.
Mas o pior mesmo foi quando ele ficou três dias inteiros trancado dentro do seu quarto, com um monte de frascos de tira-manchas na mão esfregando por todo lado.
Não teve outro jeito. Mamãe chamou os médicos e papai foi encaminhado a uma clínica psiquiátrica. Foi um golpe!
Mas lá papai foi muito bem tratado. Recebia nossas visitas com um sorriso que eu já estava até me esquecendo de como era. E começou a descobrir dons que nem sabia que possuía, como por exemplo, o de pintar maravilhosos quadros. Por fim eu achava que papai estava bem melhor que antes. Quando só vivia do trabalho para casa e vice-versa. E nunca reclamava de nada, mas eu percebia que os seus olhos não eram felizes.
 O médico até explicou que papai sofreu um ataque porque reprimia desde muito cedo suas emoções. O vovô, não era como ele, tão calmo e generoso, sem querer ou não, havia submetido o pobre filho a muita pressão. (...)

Então, tudo estava indo muito bem. Papai já estava quase por receber alta. Ele já havia até se decidido dedicar-se à nova profissão de pintor de quadros. Mas, uma funcionária nova cometeu um erro fatal. Entregou gentilmente o uniforme limpo de papai sem saber do seu mal, pois quando ele desdobrou o avental:
Lá estava ela. Enorme! Zombando-lhe, com um riso sarcástico de vitória. Aquela maldita mancha amarela.


© Por Lilly Araújo-17/05/2011 - Direitos Autorais Reservados.



















Pubicado na CBJE -RJ

5 comentários:

  1. Lilly oieee obrigada de coração..fico muito feliz de ver vc por la..que Deus te abençoe sempre!

    Então algumas pessoas falam que não consegue comentar outras consegue...não sei bem o que acontece la...eu deixei liberado pra qualquer um comentar...deve ser erro do blogger...que droga né!!!

    Bom Final de Semana!

    bjossss

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  2. Oi Lis,

    Bom final de semana!

    Mas se eu não conseguir de novo, comento no outro,HAHAHA!!

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  3. Bom Lilly,
    Primeiramente, parabéns! Acho que você quer mesmo ser escritora, pois participa muito e é muito empenhada, dois passos fundamentais para qualquer coisa.
    Well (copiei da Betty, achei meio Altiva), eu vi a data do texto na internet primeiro: Junho de 2011. Acredito que hoje, mais madura não cometeria alguns deslizes. Por exemplo: a personagem tem um tom infantil ao se referir ao pai, de início achei que ela fosse uma criança, mas depois vi que era um adulto relatando uma experiência da infância e aí achei a linguagem um tanto forçada. Alguns erros na pontuação (acho que aí está grande parte do nosso problema) atrapalharam. Mas no geral acho que essas histórias de psicoses podem partir para dois lados: o neurótico e doentio e o cômico, que foi sua opção. Funcionou bem, pois o final foi digno, irônico e surpreendente. Não fosse a dica no penúltimo parágrafo, creio que eu só descobriria quando você explicitasse. Bom texto, coloque-o numa linguagem mais madura, evite o excesso de “papai”, por exemplo, no segundo parágrafo na primeira frase você usa a palavra duas vezes. Retire também o brilho excessivo do brilhante. E, como eu disse antes, amei muito o seu texto: divertido, suave e objetivo. Um toque de humor em um desafio predominantemente dominado pelo terror fantástico.

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  4. Oi Rudá querido,

    Obrigada por comentar aqui,

    Mas eu não sei o que levou vc a pensar que se trata de um adulto contando a história, a intenção é que seja mesmo uma criança.
    Quanto a erros de pontuação, eu realmente contarei com um revisor para poder publicar meus textos.
    Aqui por enquanto é apenas um laboratório, pra eu brincar de ser feliz!

    Abraços,
    muito bom ter conhecido pessoas como vc no Desafio dos Escritores!!

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  5. Oi Rudá querido,

    Obrigada por comentar aqui,

    Mas eu não sei o que levou vc a pensar que se trata de um adulto contando a história, a intenção é que seja mesmo uma criança.
    Quanto a erros de pontuação, eu realmente contarei com um revisor para poder publicar meus textos.
    Aqui por enquanto é apenas um laboratório, pra eu brincar de ser feliz!

    Abraços,
    muito bom ter conhecido pessoas como vc no Desafio dos Escritores!!

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